Afonso Rocha

Um dos maiores vultos da literatura catarinense, nasceu em Canasvieiras (Florianópolis), a 6 de janeiro de 1863 e faleceu no Rio de Janeiro, a 29 de dezembro de 1941. Foi um escritor, jornalista, deputado e político brasileiro.

Filho de marinheiro, nascido na freguesia de São Francisco de Paula de Canasvieiras, norte da Ilha de Santa Catarina, aos treze anos foi para a Escola Naval do Rio de Janeiro, onde ficou por três anos e saiu para percorrer o mundo. 

A bordo do navio “Mercedes” conheceu o Uruguai, Argentina, Patagônia e Antilhas. A bordo do navio britânico “Theodore”, conheceu Cabo Verde e viajou pela Europa. Esteve também na África do Sul e navegou pelo Oceano Índico.

Em 1881, voltou a viver na Ilha de Santa Catarina, trabalhando em serviços burocráticos, estudando jornalismo e literatura. Liderou, de 1883 a 1887, a “Guerrilha Literária Catarinense” contra o conservadorismo romântico, visando implantar a “Ideia Nova”, ou seja, a renovação estética do Realismo-Naturalismo.

Em 1896, partiu novamente para o Rio de Janeiro, onde passou a morar. Escreveu várias obras, algumas ambientadas no cotidiano da Florianópolis de então. Seu livro “Santa Catarina: A Ilha”, é valiosa fonte de informação histórica sobre a Ilha de Santa Catarina. Em suas obras abordou contextos tão diversos como as Cruzadas e o Rio Ganges.

Amigo do poeta Cruz e Sousa, foi seu parceiro no livro Tropos e Fantasias (1885). Participou da comissão de tradução da “Brasileira das Sagradas Escrituras” (Bíblia Sagrada).

Obras principais: Traços Azuis (1884), Tropos e Fantasias (1885) – em parceria com Cruz e Sousa, Mares e Campos (1895), Rose Castle (1895), Santa Catarina: A Ilha (1900), George Marcial (1901), O Brigue Flibusteiro (1904), Histórias Rústicas (1904), Nas Ondas e Os Argonautas (1908). 

Sendo “filho” da nossa terra, sobre Virgílio, ainda respingamos estas anotações: Virgílio dos Reis Várzea, nasceu na Freguesia de Canasvieiras, logo à entrada para o Lamim, numa casa engenho pertencente à tradicional família do major da Guarda Nacional, Luiz Alves de Brito, o lavrador mais próspero e mais popular do lugar e com a vida aplicada à faina das redes. Possuía dois primitivos engenhos de açúcar e de farinha de mandioca, além de dois ranchos de pesca, onde abrigava grandes canoas na praia de Canasvieiras, junto à Ponta das Pedras. 

Seu pai, o capitão João Esteves Várzea, português, natural do Minho (norte de Portugal) quando navegando pela costa do Brasil, um belo dia aportou na ponta norte da Ilha de Santa Catarina, conheceu e se casou com Chiquinha de Andrade, que faleceu alguns anos depois, deixando-lhe dois filhos: João Esteves e Manoel. 

Casou-se novamente, desta vez com uma mocinha de quatorze anos, Júlia Maria Alves de Brito, prima da primeira mulher e com quem costumava brincar, desde criança, trazendo-a ao colo. 

Com esta segunda esposa, que viria a falecer a 2 de maio de 1904, aos 74 anos, teve cinco filhos: Júlia, Maria Amélia, Luís e Terêncio – este último falecido na idade de um ano. Seria dessa união que nasceria o nosso ilustre filho de Canasvieiras, Virgílio Várzea. Júlia Maria Alves de Brito, a mãe de Virgílio, era de família destacada, nascida de tradicional tronco português, dos Açores, que já dera comandantes de veleiros e almirantes à marinha brasileira. Pelos avós maternos, Virgílio brotou de uma associação de marinheiros (os Lemos) e lavradores (os Alves de Brito) o que lhe proporcionou heranças hereditárias decisivas.

Nas “Memórias”, caracterizou deste modo sua mãe: “casou aos quatorze anos esportivos que batiam, a cavalo, os caminhos dos arredores, enganchada como homem e enfrentava, de rebenque na mão, os escravos bêbedos, quando nos engenhos, se celebrava a fartura do melado e da cachaça.

Virgílio, é considerado o autêntico retratista dos costumes das gentes e da paisagem marinha de sua terra, introdutor do gênero marinhista na literatura brasileira e o criador do conto catarinense. Engenhos, ranchos, canoas, praias e promontórios, são paisagens constantes nos livros do escritor. 

Nas “Memórias”, atrás referidas, fala da sua liberdade e do contato com a natureza: “Não foi guri que viveu trancado” e relata ter nascido no “casarão amarelo, de quatro águas, na rua Velha, a um quilômetro do mar”, em Canasvieiras. Virgílio, era “produto de suas vidas criadas ao ar livre”, como ele mesmo anota.

Quando tinha oito anos, sua família transferiu-se para a cidade de Desterro, indo morar no bairro da Figueira, junto ao mar. Nas férias escolares, acompanhava o pai nas viagens regulares pelo litoral catarinense, transportando imigrantes europeus e cargas para os portos de São Francisco do Sul, Laguna e Itajaí. 

Em Desterro (atual Florianópolis), Virgílio passou a frequentar, em 1871 e 1872, o Colégio Rio Branco. Inicia então seu conhecimento com Cruz e Sousa, mas a amizade entre ambos se consolida em 1873, quando ambos eram alunos da escola primária do professor José Ramos da Silva. Virgílio era extrovertido e hábil conversador desde jovem.

Em 1876, o pai de Virgílio Várzea veio a falecer. O sonho de se tornar oficial da marinha do Brasil e o amor pelo mar levou Virgílio para a Escola Naval, no Rio de Janeiro. Aos 16 anos incompatibilizou-se com o professor de matemática, por ter traçado caricaturas que foram consideradas ofensivas. A reprovação nessa disciplina o fez abandonar a intenção de tornar-se oficial da Marinha do Brasil. Desgostoso e sem avisar a família, vai para a cidade de Santos, arranjando trabalho como praticante de piloto, no lugre “Lívia”. A bordo da polaca-goleta “Mercedes”, de bandeira espanhola, conheceu então as Antilhas, Cuba, Havana, Venezuela, Colômbia e fez diversas viagens para Buenos Aires, Montevidéu, costa da Patagônia e o Estreito de Magalhães. Depois foi transferido para o brigue inglês “Theodoro”, passando a percorrer outros mares. Foi um andarilho dos oceanos, conheceu os portos do arquipélago de Cabo Verde e da Europa. 

No retorno ao Brasil, a pedido de sua mãe, emprega-se por pouco tempo na tipografia do catarinense Justiniano Esteves Júnior, radicado no Rio de Janeiro. 

Algum tempo depois, volta aos mares e vai conhecer a África do Sul e os portos do Oceano Índico, viagem essa que o inspirou a escrever belos contos e novelas.

Em 1881, Virgílio resolve então ficar em Desterro e reencontra colegas dos bancos escolares, dentre eles: Cruz e Sousa, Santos Lostada, Araújo Figueiredo e Horácio de Carvalho, começando a escrever nas páginas dos jornais de Santa Catarina. 

Ainda moço, começa a ensaiar os primeiros passos no jornalismo. Na literatura e nas atividades jornalísticas é que vai desabrochar e formar-se o filho ilustre de Canasvieiras e grande escritor Virgílio Várzea. 

Em parceria com Cruz e Sousa e Manoel dos Santos Lostada, fundou e editou, em 1881, o jornal manuscrito “Colomboque circulou poucos números e, depois, a “Tribuna Popular”, que mais tarde se transformou em folha abolicionista. 

Em 1883, o médico Francisco Luiz da Gama Rosa assumiu a Presidência da Província, dando guarida ao grupo. Virgílio Várzea é, então, nomeado oficial de gabinete da Presidência, começando ali sua carreira de servidor público, ocupando diversos cargos. Em 1884, nas páginas do jornal “A Regeneração”, ataca o tradicionalismo, através de artigos, que mais tarde reuniu sob o título “Guerrilha Literária Catarinense”. Começou escrevendo versos: “Traços Azuis”, em 1884, depois, “Tropas e Fantasias”, escritos em parceria com Cruz e Sousa. 

De sua trajetória política, destacamos:

Oficial de Gabinete (cargo atual Chefe de Gabinete), no governo do Presidente da Província de Santa Catarina, Francisco Luís da Gama Rosa, nos anos de 1883 e 1884; Promotor Público em São José/SC; Secretário da Capitania dos Portos e professor no Liceu de Artes e Ofícios de Santa Catarina, em 1886.

Pelo Partido Republicano Federalista, elegeu-se Deputado Estadual ao Congresso Representativo de Santa Catarina (Assembleia Legislativa), foi Constituinte de 1892 e durante a 1ª Legislatura (1892-1893) desempenhou a função de 2º Secretário da segunda Mesa Diretora de 1892. Após o mandato parlamentar, retornou ao Rio de Janeiro, em 1896, onde escreveu para o Correio da Manhã, a Gazeta de Notícias, O País, A Imprensa, a Revista da Marinha Mercante e o Diário Mercantil, tendo lecionado Língua Portuguesa e Literatura. Em 1889 é nomeado Inspetor Escolar do Distrito Federal, exercendo esta função até à sua aposentadoria.

Da vida literária, é de salientar:

Em 1895, publica “Mares e Campos” e a novela “Rose Castle”; em 1900, a obra “Santa Catarina – a Ilha”, um trabalho que retrata o ambiente sócio cultural da sua terra, os usos e costumes de sua gente, além de dados históricos e geográficos, descrevendo as admiráveis paisagens da Ilha de Santa Catarina; no ano seguinte: “Contos de Amor”, “A noiva do Paladino”, “Jorge Marcial” e, em 1902, escreve “Garibaldi na América”. 

O mais importante de seus romances foi “O Brigue Flibusteiro”, em 1904 e relançado em 1941, ano de sua morte. Escreveu ainda outros contos: “Histórias Rústicas”, “Os Argonautas” e “Nas Ondas”. Escreveu em vários jornais do Rio de Janeiro: “Cidade do Rio”, “Gazeta de Notícias”, “Jornal do Comércio”, “O País”, “A Imprensa” “Correio da Manhã” e “Correio Mercantil” de São Paulo. 

Longe de sua terra natal, um ano antes de seu falecimento, redigiu suas “Memórias” e reviu sua obra literária, ordenando os inéditos. 

Deixou de publicar diversas obras, que mais tarde foram lançadas: “Santa Catarina – o Continente”, “Garibaldi e as Repúblicas Juliana e Riograndense”, “Cartas da Beira Mar” e “A Rosa dos Ventos”, entre outras.

Por falta de interesse próprio, não chegou a entrar para a Academia Brasileira de Letras, contudo, em 1906, o seu nome foi sugerido pelo crítico José Veríssimo, para ocupar a vaga do poeta Teixeira de Mello, mas renunciou à candidatura, em favor do amigo a quem admirava: Artu Jaceguay. 

Quando criada, a Academia Catarinense de Letras (ACL), escolheu Virgílio Várzea como patrono da sua cadeira número 40; em 1963, promoveu a comemoração do centenário de nascimento do escritor com a realização de conferências e reedições de seus trabalhos em folhas literárias. Também o Governo do Estado atribuiu o nome de “Virgílio Várzea” à rodovia que liga o centro da cidade (Florianópolis) a Canasvieiras; o município instituiu o Diploma e a Medalha de Mérito com seu nome. 

Em Canasvieiras/Balneário, seu nome foi dado à Escola Ensino Básico (EBM) “Virgílio dos Reis Várzea”, bem como ao jardim implantado na Praça Chico Camarão (Francisco Germano da Costa), frente à EBM Osmar Cunha.

Virgílio tem sido homenageado por diversas entidades, tanto no Estado de Santa Catarina como em outros estados da União, dos quais destacamos:

A Assembleia Legislativa de Santa Catarina (ALESC), instituiu o Prêmio Virgílio Várzea de Literatura (Resolução n. 12/2006);

O Estado de Santa Catarina, através da Fundação Catarinense de Cultura, instituiu o Prêmio Virgílio Várzea;

Também o governo do Estado de Santa Catarina, atribuiu seu nome à Rodovia (antiga) que liga Canasvieiras a Florianópolis/SC (via Lamim, Vargem, Monte Verde, Santo António de Lisboa, João Paulo, Itacorubi);

A Câmara de Vereadores de Florianópolis, criou a “Medalha e Diploma de Mérito Virgílio Várzea”, que distingue personalidades que, “por serviços relevantes, tiverem concorrido de qualquer forma para o engrandecimento do Município e se fizerem dignos de tal distinção”; atribuiu o seu nome à Escola de Ensino Básico (EBM) “Virgílio dos Reis Várzea”, bem como ao jardim público, implantado na praça Chico Camarão (Francisco Germano da Costa), frente à EBM Osmar Cunha, ambos em Canasvieiras/Balneário;

Homenagens prestadas em outros estados, com atribuição de seus nomes a vias e edifícios públicos: Ribeirópolis, Praia Grande/SP; Itaim Bibi/SP; Santo António, Manaus/AM; Chacrinha, Duque de Caxias/RJ; Olaria/RJ; Centro, Ubatuba/SP;

Bibliografia completa (em vida) de Virgílio Várzea:

Traços Azuis, 1884 – Desterro

Julieta dos Santos, 1990 – Florianópolis

Trapos e fantasias, 1990 – Florianópolis

Miudezas, 1887 – Porto (Portugal)

Rose-Castle, 1893 – Rio de Janeiro

Mares e campos, 1994 – Rio de Janeiro

Santa Catarina – a Ilha, 1985 – Florianópolis

George Marcial, 1901 – Lisboa

Contos de amor, 1901 – Lisboa

A noiva do paladino, 1901 – Paris

Garibaldi in América, 1902 – Rio de Janeiro

O brigue flibusteiro, 1951 – Porto (Portugal)

Histórias rústicas, 1904 – Lisboa

Os argonautas, 1908 – Lisboa

Nas ondas, 1910 – Paris

A Canção das Gaivotas, 1985 – Florianópolis

NDE: Este artigo é parte integrante do livro “Canasvieiras – Nossa História, Nossa Gente, de Afonso Rocha. O autor é acadêmico , membro da Academia de Letras de Biguaçu, em Santa Catarina.

Compartilhar: