As aventuras de um caipira muito arretado, que um dia saiu de casa pensando em conquistar o mundo.
Ele era conhecido nas redondezas onde morava como Zé Biguá. O Zé era uma escolha da mãe, devota de São José. O complemento nada tinha a ver com o pai, nem tampouco com a ave homônima. Ficava por conta de certo hábito que ele tinha em sair correndo para a privada logo depois de uma refeição. A rima que resultou das galhofas que o acompanhavam nessas ocasiões acabou por lhe conferir a alcunha que ele passou a carregar desde menino. Mas deixemos os detalhes sórdidos de lado e atemo-nos à história de Zé Biguá, um caipira cheio de esperteza que um dia saiu de casa disposto a conquistar o mundo.
E foi com essa disposição que Zé Biguá acabou por se encontrar no grupo selecionado para trabalhar como peão na fazenda Santa Rita, em Araçatuba. No primeiro dia, os peões contratados foram divididos entre as funções que iriam desempenhar. À Zé Biguá coube cuidar dos touros reprodutores da fazenda, na ingrata função de apontador. Quando soube do que se tratava, Zé Biguá pensou em desistir. Ajudar o touro a encontrar o caminho para cobrir a vaca não era o trabalho que sonhava. Apesar disso, acabou ficando. Precisava do emprego e, afinal, havia trabalhos piores na fazenda.
Ele ficou sob a supervisão de Tanaka, um sansei nascido lá para as bandas de Birigui, no interior de São Paulo. O Japa, como Tanaka era conhecido entre alguns peões, já era antigo naquela fazenda, aonde chegou menino para aprender as lidas do campo. Era um sujeito calado e muito trabalhador, ao contrário de Zé Biguá, que adorava uma prosa e não era lá muito dedicado ao trabalho.
Por alguma razão que só o destino sabe, Tanaka e Zé Biguá acabaram se tornando grandes amigos. Trabalhavam juntos, farreavam juntos e até se metiam em confusão juntos. Era quase certo que estavam envolvidos, quando estourava alguma briga no Treze de maio, um clube de forró muito animado que havia nas cercanias da cidade.
Um dia, quando o Zé Biguá se esforçava para ouvir as recomendações de Tanaka sobre a lida com o touro Mimoso, ela passou. Era Ritinha, a filha do fazendeiro. Ao fitar seu olhar cheio de promessas, Zé Biguá se apaixonou perdidamente. Tanaka, é claro, logo percebeu o que estava se passando e tratou de advertir o amigo afoito.
— Larga mão de sê besta, sô! Aquela é a filha do patrão e é mió ficá longe.
— Mas ela é tão bunita… — Disse o caipira com o olhar abestalhado.
— Ela é um caminhão de encrenca, isso sim. Se o patrão discubri o teu zóio cumprido para ela, vai lhe cortá os bagos e dá pros cachorros.
— Ui! — Exclamou Zé Biguá com as mãos protegendo suas partes mais valiosas.
— É mió isquecê que viu a moça.
— Já isqueci! — Disse Zé Biguá de modo enfático, mesmo sabendo que não era verdade.
Ele até que tentou tirar seu “zóio cumprido” da Ritinha. Tinha muito amor por suas partes baixas, as quais considerava o único motivo de orgulho que tinha na vida, e não gostaria de pô-las em risco por nenhum rabo de saia. Mas o destino parecia conspirar e armava situações que os colocavam próximos um do outro com muita frequência. Eram encontros fortuitos, onde o máximo que acontecia era um cumprimento, que ela respondia de modo distraído, mas que para ele eram promessas de amor que logo seriam cumpridas. Assim, não tardou em descobrir seus hábitos, caminhos que percorria e seus horários. Mas apesar do seu esforço, ela não lhe dava a mínima. Então, um dia ele começou a pensar estar a fazer papel de tolo. De tanto matutar isso, desistiu da Ritinha e voltou sua atenção para as moças que frequentavam o Treze de maio, que também era conhecido na região como “Balança Tetas”.
Mas, eis que o destino voltou a conspirar, ou teria sido a própria Ritinha? Difícil dizer, mas o fato é que uma noite ele deu de cara com ela no salão do clube. Era o baile do Dia dos Namorados e Zé Biguá sentiu que a noite prometia, quando a viu, toda sorridente a lhe olhar. Para algumas coisas ele não era muito esperto, mas para safadeza, não tinha sujeito mais ligeiro.
E assim foi. Eles dançaram a noite inteira e, depois disso, tornaram-se praticamente inseparáveis. Aproveitavam cada oportunidade para ficar juntos, apesar de o medo de Zé Biguá em ser flagrado pelo pai da Ritinha e arriscar perder o emprego e… Aquilo que você está pensando, caro leitor.
Os meses se passaram, mas apesar dos beijos e amassos por trás do pé de manga, Ritinha fazia jogo duro e não permitia maiores intimidades. Aquela situação estava deixando Zé Biguá numa situação que dava dó. Tu o que conseguia era amassar mamão e, depois, correr para o alojamento e matar bem-te-vi a soco, debaixo das cobertas.
De tanto sofrer por algo que não ia acontecer, Zé Biguá se afastou de Ritinha e voltou a dirigir sua atenção para as meninas mais liberais do Balança Teta. Mas o destino, sempre ele, não ia deixar isso barato. Já estava escrito ter planos para o caipira e sua Ritinha.
Num certo dia, quando Zé Biguá procurava um touro fujão lá para as bandas da cachoeira, ele ouviu um barulho. Vinha da direção de um riacho próximo. Ele imaginou que alguns moleques tinham invadido a propriedade para tomar banho. Era verão, e isso sempre acontecia naquela época do ano, em razão do forte calor.
Sempre disposto a se divertir às custas de alguém, Zé Biguá se moveu furtivamente na direção do barulho. Sua intenção era roubar as roupas dos garotos e, depois, assustá-los, para que saíssem correndo pelados pela mata. O Capim-gordura ia lhes deixar as pernas lanhadas e os pés de urtiga fariam o resto.
Assim fez, mas a cena com que se deparou não era bem o que esperava. Quando ele afastou um arbusto que lhe obstruía a visão, deu de cara com Ritinha. Ela se banhava no riacho como veio ao mundo. Ao vê-la nua pela primeira vez, Zé Biguá quase teve um ataque cardíaco. A visão daquela nudez esplendorosa era mais do que ele ousou sonhar algum dia. Ritinha era bonita, ele sabia, mas nua era uma deusa.
Sem fazer barulho, ele ficou espiando-a se refrescar. Deitada na água rasa, Ritinha ora ficava de costas, ora ficava de bruços, num deleite que não tinha fim. Em certo momento, ela se pôs de costas novamente e abriu as pernas contra a correnteza. Logo depois a espevitada moça gemia baixinho e intrigou Zé Biguá.
— O que ela tá fazendo? — Perguntou para si, até que a viu se acariciar e compreendeu o que Ritinha estava fazendo. — Safada!
Zé Biguá ficou indignado. Ritinha tinha se negado a lhe conceder seus favores, mas tava de sacanagem sozinha ali no mato. Sem mais se conter, ele tirou suas roupas e correu na direção dela. Ritinha iria aprender com quantos paus se fazia uma canoa, ou ele não se chamaria mais Zé Biguá. Quando ela o viu, ficou de pé num pulo.
— O quê ocê tá fazendo aqui? — Gritou ela, tapando suas vergonhas com as mãos.
— Não tô fazendo nada. — Disse Zé Biguá, já com a espada em riste. — Mas vô fazê, ora se vô!
Dito isso, pulou em cima dela e a forçou a cair de costas. Mas Ritinha era forte e corcoveou como uma potranca selvagem, até que ele perdeu o equilíbrio e atirado para o lado. Ritinha se levantou ofegante e o olhou furiosa.
— Se queria tanto isso, era só pedir. — Ela disse para o espantado caipira.
— Só pedir? — Ele perguntou confuso.
— Só pedir. — Ela repetiu com um sorriso safado.
Ritinha se aproximou e sentou-se sobre seu peito. Zé Biguá ficou todo vermelho, quase sem ar.
— Peraí! — Ele protestou.
— Ué! Tu não queria fazê safadeza cumigo? Vou te mostrar como se faz. Lambe minha florzinha, lambe.
Ela encostou seu sexo na cara do espantado Zé Biguá. O caipira nunca tinha feito aquilo, mas não se fez de rogado e caiu de boca, ou melhor, meteu a língua. Ritinha soltou um longo gemido de satisfação e se mexeu como um lambari preso no anzol. Depois afastou-se do rosto dele.
— Só isso? — Protestou ele, sem entender.
— Tá só começando. — Disse ela, cheia de más intenções.
Com um sorriso de gato querendo comer o canário, ela se ajeitou sobre seu membro e soltou-se lentamente, até o engolir por inteiro. Foi a vez de Zé Biguá gemer como um touro enlouquecido, e só pararam quando a tarde já findava. Depois daquele dia, eles corriam para aquele riacho, sempre que fosse possível. É claro que, depois de tantos encontros às escondidas, o inevitável aconteceu. Ritinha engravidou e o pai, que não era bobo, não tardou em descobrir que seria avô. O circo estava armado para estragar a festa do Zé Biguá e privá-lo das partes mais estimadas de seu corpo desengonçado.
Mas o caipira também não era bobo. Logo que descobriu que Ritinha não o tinha entregado, apesar da pressão e das ameaças do pai. Então Zé Biguá se fingiu de morto e começou a planejar uma rota de fuga. Nesse ínterim ele percebeu que muitos peões começaram a pedir as contas e foram embora da fazenda. Num dia foi o Arlindo, no outro foi o Honório, depois o Ernesto e… Até o Tanaka! De repente o Japa pediu as contas e sumiu no mundo.
Matutando sobre o porquê de tanto peão ir embora de repente, Zé Biguá demorou demais a entender que também deveria picar a mula. Sua história com a Ritinha foi descoberta, e o caipira ficou encrencado. Numa manhã, depois de uma noite de folia rolando com a amada no paiol de milho, ele acordou com uma espingarda de cano duplo apontada para o seu estimado patrimônio abaixo da cintura.
Era o ultrajado pai da Ritinha, acompanhado de dois jagunços. Um deles tinha um castrador nas mãos e olhava para ele com uma expressão tão feliz que parecia a encarnação de um psicopata assassino de algum filme trash.
— Pelamor de Deus, não é nada disso que o senhor tá pensando. — Balbuciou o Zé Biguá apavorado, tentando esconder sua nudez com sabugo de milho.
— Isso mermo. Não é nada disso. — Berrou Ritinha furiosa ao perceber o olhar guloso dos peões sobre si.
— Não é o que eu tô pensando, indecentes? Como vocês sabem o que eu tô pensando? Agora só tem um jeito de terminar com essa pouca-vergonha. — Respondeu o fazendeiro.
— Que jeito? — Perguntou Zé Biguá, já engolindo em seco, ao ver o peão que segurava o castrador exibi-lo de modo obsceno.
— Casamento! — Berrou o fazendeiro
Zé Biguá suspirou aliviado. Àquela altura, casamento com a filha do fazendeiro era um mal menor. Não só conservava o seu patrimônio, como ainda aumentava. Ele já ia manifestar sua concordância quando Ritinha embirrou.
— Não caso.
— Casa! – Berrou o pai.
— Não caso! — Teimou ela.
— Casa, sim!
Aquele impasse continuou por algum tempo, mas ela cedeu ao ver a expressão desesperada do Zé Biguá.
Então o casamento aconteceu tão logo os trâmites legais foram cumpridos. Zé Biguá foi promovido a capataz da fazenda e, a partir disso, tornar-se ele próprio um fazendeiro era só questão de tempo.
Além de tudo, ele ainda tinha a Ritinha, que carregava o herdeiro na barriga. Melhor não podia ser, podia? Talvez não. Mas o destino gostava de pregar peças, especialmente em espertalhões como Zé Biguá.
Meses depois, numa madrugada fria de bater o queixo, Ritinha entrou em trabalho de parto. Uma parteira foi chamada às pressas, enquanto Zé Biguá partia para a cidade em busca do médico. Nem precisava tanto. Ritinha se mostrou à altura da empreitada e logo deu à luz. Ao médico coube apenas fazer alguns exames para se certificar que mãe e filho passavam bem.
Depois de tanta ansiedade, Zé Biguá estava louco para ver o herdeiro, mas a porta do quarto estava vedada para ele. Mas depois de alguns quilômetros percorridos na sala e um rolo de fumo consumido, a porta se abriu e a parteira apareceu com o bebê nos braços.
— É um menino. — Ela disse muito séria.
Zé Biguá apagou o palheiro e correu para ver o herdeiro. Ansioso, afastou as fraldas que o encobriam e deu de cara com um bebezinho rosado de olhos puxados. O menino era a cara do Tanaka.
— Aquele fio de uma égua! — Exclamou Zé Biguá, ao perceber que tinha entrado de gaiato numa festa e, depois, foi deixado para trás, para pagar a conta.
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